Sunday, April 12, 2015

POEMA HUSI Xanana Gusmão

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POEMA HUSI 
Xanana Gusmão


PÁTRIA


Pátria é, pois, o sol que deu o ser
Drama, poema, tempo e o espaço,
Das gerações, que passam, forte laço
E as verdades que estamos a viver.



Pátria... é sepultura... é sofrer
De quem marca, co'a vida, um novo passo
Ao povo - uma Pátria - é, num traço
simples... Independência até morrer!



Do trabalho o berço, paz tormento,
Pátria é a vida, orgulho, a aliança
Da alegria, do amor do sentimento.



Pátria... é tradições, passado e herança!
O som da bala é... Pátria, de momento!
Pátria... é do futuro a esperança!



OH! LIBERDADE!


Se eu pudesse
pelas frias manhãs
acordar tiritando
fustigado pela ventania
que me abre a cortina do céu
e ver, do cimo dos meus montes,
o quadro roxo,
de um perturbado nascer do sol
a leste de Timor



Se eu pudesse
pelos tórridos sóis
cavalgar embevecido
de encontro a mim mesmo
nas serenas planícies do capim
e sentir o cheiro de animais
bebendo das nascentes
que murmurariam no ar
lendas de Timor



Se eu pudesse
pelas tardes de calma
sentir o cansaço
da natureza sensual
espreguiçando-se no seu suor
e ouvir contar as canseiras
sob os risos
das crianças nuas e descalças
de todo o Timor



Se eu pudesse
ao entardecer das ondas
caminhar pela areia
entregue a mim mesmo
no enlevo molhado da brisa
e tocar a imensidão do mar
num sopro da alma
que permita meditar o futuro
da ilha de Timor



Se eu pudesse
ao cantar dos grilos
falar para a lua
pelas janelas da noite
e contar-lhes romances do povo
a união inviolável dos corpos
para criar filhos
e ensinar-lhes a crescer e a amar
a Pátria Timor!




(Cipinang, 8 de Outubro de 1995)




GERAÇÕES


Nomes sem rosto
corações esfaqueados
de lembranças
nas lágrimas de crianças
chorando pelos pais...



Mais do que a morte
que os fez calar
em cada gota de lágrima
a cena cruel



...uma mãe que gemia
sem forças seu corpo desenhava
marcas da angústia
esgotada



Os farrapos que a cobriam
Rasgados
no ruído da sua própria carne
sob o selvático escárnio
dos soldados indonésios
em cima dela, um por um



Já inerte, o corpo da mulher
se tornou cadáver
insensível à justiça do punhal
que a libertara da vida



enquanto...
golpes de coronhadas
se repercutiam
nas gotas de lágrimas que iam caindo
da mesma face das crianças



Um pai se ofendera
no último não da sua vida
a mulher violada
assassinada sob os seus olhos



O cheiro da pólvora
vinha de muitos furos
daquele corpo
que já não era corpo
estendido
sem forma de morte



e...


As lágrimas secaram
nas lembranças das crianças
veio o suor da luta
porque as crianças cresceram



Quando os jovens seios
estremecem sob o choque eléctrico
e as vaginas
queimadas com pontas de cigarro
quando testículos de jovens
estremecem sob o choque eléctrico
e os seus corpos
rasgados com lâminas
eles lembram-se, eles lembram-se sempre:



A luta continuará sem tréguas!


(Cipinang, 5 de Novembro de 1995)


POVO SEM VOZ



Nosso grito é o silêncio


Na passagem do tempo


E o tempo é o sangue


No silêncio do mundo!



- Ouvi, mundos!


Ouvi , gentes da política!


Invadistes a nossa Pátria com o Suharto,


Isolastes Timor-Leste na guerra fria


e torturasses-nos com a indiferença


e matastes-nos com a cumplicidade.




- Ouvi, ouvi as vossas culpas!


Desengajastes a nossa causa com Jacarta,


Minimizastes o nosso direito na ONU


e prendestes-nos com iénes


e massacrastes-nos com dólares.




Nosso tempo é o silêncio


Nas mudanças do mundo


e o sangue é o preço


nos mundos do silêncio!




- Ouvi, mundos!


Ouvi, gentes do poder!


Abençoastes a mortandade com Catedrais,


Enterrastes a tragédia nos investimentos


e desafiastes a nossa consciência


e reprimistes os nossos anseios.




- Ouvi, ouvi as vossas culpas!


Atraiçoastes os vossos próprios princípios,


Manipulastes as vossas próprias normas


e encarcerastes-nos na realpolitik


e matastes-nos como os direitos humanos.




... Somos POVO SEM VOZ


alma sem fronteira com a dor


corpo na escravidão aberto ao tempo


Pátria - um cemitério de interesses!


A nossa luta...


é a história


do poder do silêncio!
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